domingo, 3 de agosto de 2008

O meu pai e os aviões (Ambriz 1961-1964)

Em 1961 fomos viver para o Ambriz, no auge do rebentamento da guerra colonial. O primeiro hangar das avionetas do Aero Clube do Ambriz era ao lado da minha casa!!! Depois foi construído um hangar condigno para recolher os dois Auster existentes os quais foram baptizados de "O Desejado"- o CR-LFD, talvêz por ser o avião mais querido dos pilotos, e o outro foi baptizado de "Kaúlza de Arriaga" -o CR-LFN, numa homenagem que a política de então quis fazer a esse militar de alta patente.
O meu pai trabalhava no Ambriz como contabilista e não podia ficar indiferente aos militares que ocuparam o Ambriz - muitos sem "saber ao que iam". Como as acomodações no quartel eram precárias, o meu pai ofereceu a sua casa a muitos oficiais militares, normalmente aqueles que levaram as esposas para Angola. Fizeram-se então muitas amizades mas infelizmente, interrompidas com o regresso desses militares quando chegava o fim da comissão. O meu pai sentiu a necessidade de apoiar quem o apoiava, neste caso a tropa portuguesa que estava ali a defender território português em condições deficientes mas impostas pelo regime de Salazar. Então os dois Auster do Aero Clube, com o meu pai como piloto, fizeram inúmeros serviços para o Exercito Português, nomeadamente a evacuação de feridos das ZO's (zonas operacionais) para Luanda, transporte de víveres e de correspondência aos militares em ZO's. Os aviões também traziam algo inapalpavel as soldados deslocados - um sentimento de segurança e de poderio sobre o inimigo. Muitas das pistas em ZO's eram feitas pelos próprios soldados, que desbravavam mato e alisavam o chão de terra para possibilitar as aterragens. As aterragens e as descolagens dos aviões eram feitos com os soldados a ladearem a "pista" improvisada com as armas apontadas ao mato.
Possuo uma carta do Comando Militar de Angola a elogiar e a agradecer os serviços prestados pelo meu pai ao Exército Português.
Naturalmente o meu pai criou muitas amizades no seio da tropa e , se se lembrava de alguns comandantes não se lembraria de todos os militares, pois o piloto era só um e os militares eram muitos. Era mais fácil serem eles a lembrarem-se da sua cara. Daí que, em 1976/1977, quando o meu pai trabalhava em Lisboa, era muitas vezes abordado na rua e no Metro por ex-combatentes que o cumprimentavam com alegria entabulando, logo ali, conversações animadas sobre o passado conjunto nas "matas do inferno".


Os irmãos Fernando, Jorge, Lena e Kady Duarte (eu) posando ao lado de "O Desejado"
Fernando, Kady, Jorge e Lena, novamente com "O Desejado"

Fernando Duarte (1959-1998) posando ao lado do Auster

O "hangar" improvisado ao lado da nossa moradia no Ambriz

O hangar do Aero Clube do Ambriz, construído mais tarde

Pista Três Marias inaugurada pelo meu pai em 09-05-1964

O meu pai na pista improvisada no Quixico com o avião "Kaúlza de Arriaga"

O meu pai na pista improvisada Furriel Dantas com o avião "Kaúlza de Arriaga"

Sem comentários: